Muitas pessoas, por motivos diversos, utilizam veículos próprios para deslocamento até o trabalho e também para realizar suas atividades profissionais.
Uma dúvida que surge, nesse momento, é se essas pessoas têm direito a ressarcimento pelos danos consequentes da utilização de seus veículos para o trabalho.
Há duas situações: quem utiliza seu veículo, carro ou moto, para ir até o trabalho e retornar à sua casa, e aqueles que precisam do veículo para que possam realizar a atividade profissional, caso de muitos entregadores, por exemplo.
Neste artigo, trago para a discussão e explico o que diz a legislação em vigência sobre esses assuntos.
Vale transporte pode ser trocado por combustível? Essa depreciação do veículo pode ser considerada decorrente do trabalho?
Trarei, ao longo das próximas seções, diferentes pontos de vista sobre o assunto para tentar responder a essas e a outras perguntas.
Vale-transporte
O vale transporte foi instituído como direito em 16 de dezembro de 1985, pela Lei Federal nº 7.418.
Essa lei é bastante específica e define que o vale transporte deve ser fornecido pelo empregador, seja ele pessoa física ou jurídica, de forma antecipada.
Além disso, o art. 1º da Lei prevê que esse vale-transporte deve ser suficiente para cobrir as despesas com transporte do empregado para o trecho casa-trabalho e trabalho-casa.
Outra especificidade dessa legislação é que o trecho será coberto por vale-transporte desde que realizado por meio de transporte público coletivo, seja ele urbano, intermunicipal ou interestadual.
O artigo ainda define que ficam excluídos aqueles transportes de natureza especial e os serviços seletivos.
Na prática, devem ser oferecidos os vales-transportes para ônibus, trens, metrôs e semelhantes, desde que tenham linha regular e tarifa afixada pela autoridade que os gerir.
Gastos com combustível
Levando em consideração a lei nº 7.418, as empresas não são obrigadas a arcar com os gastos de combustível de seus funcionários que utilizam veículos próprios para o mesmo trecho.
No entanto, embora a obrigatoriedade não exista, muitos empregadores optam por fazer esse pagamento a seus empregados.
De modo geral, eles oferecem quantia ou vale combustível equivalente à mesma porcentagem do salário correspondente ao vale-transporte dado para os demais.
Tendo em vista a não obrigatoriedade de o empregador arcar com gastos daqueles que decidem utilizar veículo próprio para ir ao trabalho, não há precedentes que permitam reclamação por esse motivo.
Em 2017, no TRT (Tribunal Regional do Trabalho) de Minas Gerais, uma juíza emitiu decisão desfavorável a uma pessoa que buscou o judiciário para pedir reembolso de gastos com combustível.
No caso, o próprio empregado assumiu ter escolhido utilizar veículo próprio para se locomover até o local onde trabalhava, eximindo a responsabilidade da empresa de fornecer vale-transporte.
A situação muda de cenário quando esses gastos acontecem devido ao uso para exercício da atividade profissional.
Se um empregado precisa, para dar andamento a seu serviço, de um veículo para visitar clientes ou fazer entregas, por exemplo, e a empresa para a qual ele trabalha não disponibiliza um veículo, o caso deve ser visto à parte.
Alguns empregadores adotam a prática de pagar ao funcionário por “quilômetro rodado”, levando em consideração, no entanto, apenas o combustível usado nos deslocamentos.
A necessidade de olhar de forma diferente para situações desse tipo ocorre porque esses gastos se equiparam, de acordo com alguns juízes, àquilo presente nas previsões do artigo 2º da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).
O artigo em questão determina que o empregador assume “os riscos da atividade econômica” e, consequentemente, que o custo da atividade não pode ser transferido ao trabalhador.
Segundo o raciocínio utilizado em alguns julgados, o gasto de combustível para dar continuidade às atividades da empresa corresponde também a esses riscos e deve ser incluído nos custos de que o empregador deve se encarregar.
Depreciação do veículo
Um aspecto que tem estado bastante presente nas discussões e que se mostra mais problemático do que o simples gasto com combustível é a depreciação do veículo.
Como todos sabemos, o uso de um automóvel gera danos a longo prazo e, além disso, sua simples presença nas vias o torna suscetível a acidentes e avarias.
Por isso, muitos empregados têm buscado o judiciário para discutir questões desse caráter, uma vez que não há legislação que trate disso especificamente.
Em julgados recentes de diversos estados brasileiros, juízes determinam que os custos de depreciação sejam de responsabilidade do empregador.
A justificativa dada é a de que todo o custeio do veículo usado no transporte do empregado em serviço deve ser feito pelo empregador, seja ele relativo a combustível ou a manutenções de qualquer espécie.
Diferente do que acontece com o vale-transporte, o empregado não pode ter descontado de seu salário qualquer porcentagem decorrente do uso de veículo para transporte necessário ao exercício de suas funções, ainda que ele seja de sua propriedade.
É preciso, no entanto, que haja um acordo entre empregador e empregado no qual o primeiro mostre-se de acordo com a prática do segundo de utilizar seu veículo para realizar suas tarefas.
Em julgamento de caso análogo, a 4ª Turma do TST (Tribunal Superior do Trabalho) decidiu que o empregado somente teria direito a ressarcimento se não houvesse veículo da empresa disponível para execução das tarefas, se esta desse sua permissão para tal prática ou na ocorrência de ambas as circunstâncias.
Quem escolhe utilizar seu carro ou sua moto para ir e voltar do trabalho decide, muitas vezes, pela comodidade de não depender dos meios de transporte coletivos com suas escalas e horários.
No entanto, deve ficar atento ao fato de que os gastos que tiver com essa opção não serão obrigatoriamente ressarcidos por seu empregador.
O que jurisprudências atuais apontam, por outro lado, é que o reembolso por depreciação do veículo usado para trabalhar é responsabilidade da pessoa jurídica que contratou o trabalhador.
É possível, de início, estabelecer um regime para que essas lacunas sejam sanadas junto ao empregador, a fim de não gerar transtornos futuros e de que cada um cumpra com suas obrigações.
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